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A jornada de 80 horas da CNI

Atualizada em 02/08/2016 16:23

Em evento que reuniu Michel Temer e mais de 100 empresários no início de julho (08), o presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Robson Braga de Almeida, defendeu a reforma trabalhista e citou como exemplo a França, “que, de 36 [horas] passou agora para 80”. Referia-se à Lei do Trabalho, em vigor desde o dia 21 de julho.

A manchete do site jornalístico Tijolaço foi certeira: “Chamem a Princesa Isabel”. O discurso do presidente da CNI virou motivo de piada na internet e foi rapidamente corrigido: não se tratava de 80, mas de 60 horas semanais. Ah bom...

Mudanças

Na verdade, as mudanças impostas pelo governo francês são crueis, mas estão longe do que Braga defendeu como aceitável.A jornada de trabalho na França continua sendo 35 horas semanais. O que mudou foi o regramento das horas suplementares.

Até então, mediante acordos coletivos da categoria assinados pelos sindicatos (similar às convenções coletivas), as 35 horas legais podiam ser acrescidas de horas adicionais por um período de até 12 semanas consecutivas, desde que a média semanal não ultrapassasse 44 horas e o turno diário, 10 horas. As horas suplementares (acima de 35) eram pagas com adicional de 25%, as dez primeiras horas, e 50%, as demais, ou compensadas por dias a mais de folga durante o mês ou ao longo do ano.

Com a mudança, o limite de 44 horas semanais sobe para 46, por até 12 semanas consecutivas e, num dia, o trabalhador pode fazer até 12 horas. O que há de mais grave aqui é que a ampliação dependerá apenas de um acordo na empresa , ainda que os acordos coletivos disponham o contrário.

Mas e as 60 horas? De fato, a jornada poderá ser ampliada em casos excepcionais e por um curto, mediante autorização do órgão público que fiscaliza o cumprimento da legislação trabalhista. Aqui também vale a regra de pagamento das horas suplementares ou compensação com dias de folga. Uma situação, portanto, bem diferente do que foi propagandeado pelo presidente da CNI.

Isso não torna a reforma trabalhista na França menos grave e deve servir como alerta para os trabalhadores brasileiros.

As novas regras facilitam as demissões por questões econômicas, barateiam as indenizações e podem reduzir o adicional de hora extra. O mais grave é que elas restringem o poder dos sindicatos, permitindo a prevalência dos acordos por empresa em questões relativas a jornada e horas extras.

A Lei do Trabalho colocou os trabalhadores franceses em pé de guerra durante os cinco meses em que tramitou. Apesar da pressão, acabou adotada em 21 de julho por meio de um dispositivo constitucional que permite a sua aprovação sem votação na Assembleia Nacional.

Aqui, a reforma na França corre o risco de virar peça de propaganda do empresariado e o presidente da CNI é um exemplo. Seu discurso inconsequente faz mais do que expor ignorância sobre o assunto, mas revela a ferocidade do loby patronal por mudanças na legislação trabalhista.

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