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STF proíbe substituição de escola por educação domiciliar

Atualizada em 12/09/2018 21:37

Lugar de criança é na escola. Por 9 votos a 2, o Supremo Tribunal Federal (STF) confirmou aquilo que a Constituição Federal, a LDB e o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) já garantem: é obrigação dos pais matricular e assegurar a permanência de seus filhos na escola.

A ação no STF tratava de um caso concreto, ocorrido no Rio Grande do Sul, mas a decisão tem repercussão geral, ou seja, deve ser aplicada às demais ações, congeladas desde 2016 à espera da decisão do STF.

A história começa na cidade gaúcha de Canelas. Uma criança de 11 anos, representada por seus pais, recorreu à Justiça contra a decisão da Secretaria Municipal de Educação de exigir sua permanência na escola. Alegando questões de natureza pedagógica e religiosa, a família pretendia a liberação para todo o ensino fundamental e médio. Não convenceu o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul e, então, recorreu ao Supremo.

Matrícula e frequência obrigatórias

Está na Lei: os pais são obrigados a matricular seus filhos a partir de 4 anos na educação básica, na rede regular de ensino, junto com o Poder Público, devem zelar pela frequência nas aulas. Essas exigências encontram-se nos artigos 5o e 6o da LDB (Lei 9.394); 54 e 55 do ECA (Lei 8.69/90) e também no artigo 208, parágrafo 3o ,da Constituição Federal.

 

Ignorando toda a legislação, o relator do processo, Ministro Luís Roberto Barroso, julgou a ação procedente. Para ele, a Constituição não fala especificamente da educação domiciliar. Se não trata do assunto, também não proíbe. Logo, em seu raciocínio tosco, o ‘homeschooling’ é constitucional e o pais têm o direito de escolher como os seus filhos vão estudar.

Crenças pessoais acima da lei?

Como tem sido frequente em suas decisões, Barroso colocou suas convicções pessoais acima da lei. Para justificar seu voto, discorreu sobre a ineficiência do Estado e a baixa qualidade do ensino (inclusive nas privadas). Considerou aceitável que os pais tirem seus filhos das escolas como forma de “proteção física e moral, retirando-os de ambientes escolares agressivos, incapacitantes ou limitadores” ou por motivos de ordem moral e religiosa. “Para muitas pessoas, uma educação religiosa ou moral de acordo com suas próprias convicções só pode ser prestada pelo ensino domiciliar”, afirmou o relator.

O desvario de Barroso não parou por aí. Além de liberar algo que afronta a legislação, ele propôs regras para o funcionamento do ensino domiciliar até que o Congresso Nacional aprove uma lei sobre o assunto.

Segundo a ministra Rosa Weber , “o sistema educacional não reconhece o ensino domiciliar. Os legisladores regulamentaram a questão no Plano Nacional de Educação, no Estatuto da Criança e do Adolescente e na LDB”. Ela concluiu o seu voto afirmando que mesmo se o Supremo reconhecesse o ‘homeschooling’, caberia ao Poder legislativo a tarefa de regulamentá-lo.

Para o ministro Alexandre Morais, “a família não tem o direito de excluir o que a Constituição Federal definiu como um dever do Estado”. Ele também admitiu a possibilidade de existência do ensino domiciliar, desde que condicionado à existência de lei.

Por outro lado, os ministros Luis Fux e Ricardo Levandowski consideraram a educação domiciliar inconstitucional. Segundo Fux, “o parágrafo 3o do artigo 208 é inequívoco: exige a frequência escolar e o controle feito pelo Poder Público e pelos pais dos alunos.” E completou: “a partir da frequência escolar, a criança encontra o seu lugar no mundo, no convívio com outras crianças”.

Fux também ressaltou que a escola assegura um olhar profissional necessária à formação das crianças e uma proteção contra ambientes familiares opressores ou violentos.

Para Ricardo Lewandowski , a educação domiciliar fere os princípios republicanos garantidos na Constituição Federal, pois prioriza o interesse individual em detrimento dos direitos e deveres da coletividade. Ele também se referiu ao fato de a família, religiosa, não aceitar o Evolucionismo ensinado na escola.”Os pais podem falar de suas crenças e até apontar falhas do que foi ensinado na escola, mas não podem privar os seus filhos do acesso a este conhecimento”.

Lewandowiski citou uma decisão anterior do ministro Barroso: “os pais não podem pretender limitar o universo informacional de seus filhos ou impor à escola que não vincule qualquer conteúdo com o qual não esteja de acordo”. (ADIN 5537).

Placar pouco comum

Um único ministro, Edson Fachin, votou parcialmente junto com o ministro Luís Roberto Barroso. Uma constrangedora lavada para um ministro que tem deixado suas crenças ou interesses se sobrepor à lei. Foi o que se viu agora, foi também o que ocorreu no julgamento sobre terceirização.

O ministro Barroso tem o legítimo direito de reconhecer a educação como opção diante das escolas que não ensinam, que são perigosas, que contrariam os princípios morais, filosóficos e religiosos de algumas famílias. E pode também criticar o "paternalismo" e o "intervencionismo" do Estado. O que não é aceitável que use esses argumentos para proferir uma sentença. Se deseja resolver todos esses problemas, deve exonerar-se do cargo que ocupa e buscar uma alternativa política, democrática e republicana. O Congresso Nacional, por exemplo.

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