Direitos

Direitos ameaçados: cresce pressão pela derrubada do veto à Emenda 3

Atualizada em 23/03/2007 16:10

Cresce a pressão de empresários no Congresso Nacional pela medida que impediria fiscais de autuarem empresas que mantêm empregados sem registro, conhecida como Emenda 3.

Na semana passada, o presidente Lula vetou a Emenda. Mas agora é forte o lobby para que os parlamentares derrubem o veto, o que está sendo duramente criticado pelas centrais sindicais e sindicatos, porque, se virar lei, a Emenda 3 trará como conseqüência a precarização das relações de trabalho.

A pressão dos trabalhadores pela manutenção do veto pode fazer toda a diferença nessa queda–de-braço. Mande uma mensagem para os deputados e senadores pedindo a manutenção do veto.

O que diz a Emenda 3
O projeto de lei 6772/05 tinha como objetivo otimizar o processo de fiscalização e arrecadação, unificando as secretarias da Receita Federal e da Previdência Social. A Emenda 3 incluiu um elemento estranho ao assunto, porque ela trata das atribuições dos fiscais do Ministério do Trabalho (que não tinham nada a ver com a “Super-Receita”).

Na verdade, a “Emenda 3” alterou uma outra lei - a de número 10.593/2002, que regulamenta as carreiras de auditores fiscais da Receita, da Previdência e do Trabalho. A mudança proposta por Ney Suassuna acrescentou um parágrafo com a seguinte redação:

“ no exercício das atribuições da autoridade fiscal de que trata esta Lei , a desconsideração da pessoa, ato ou negócio jurídico que implique reconhecimento de relação de trabalho, com ou sem vínculo empregatício, deverá sempre ser precedida de decisão judicial.”(NR)

Em bom português isso quer dizer que os fiscais de que trata a lei 10.593 (entre eles, portanto, os auditores do Ministério do Trabalho), só podem autuar e multar uma empresa que mantém trabalhadores sem registro em carteira se a mesma já tiver sido condenada em decisão judicial pelo mesmo motivo.

Ora, na ordem natural das coisas, é a fiscalização que precede a ação judicial. Esta é a última alternativa no caso de descumprimento da lei. Não que o processo administrativo seja a solução de tudo. Os sindicatos estão cansados de ver empresas que se arriscam a uma auditoria ou preferem arcar com a multa e continuar incorrendo nas mesmas irregularidades.

Em muitos casos, porém, a fiscalização serve para coibir ilegalidade e regularizar situações. Ajuda, inclusive, em eventuais ações judiciais.

Inegavelmente, o que a mudança propõe é facilitar a vida de quem não tem apreço à lei. É favorecer quem aposta na impunidade.

De que Brasil estamos falando?
Entre os que defendem a manutenção da “Emenda 3” e os que se opõem a ela existe uma curiosidade. Eles descrevem dois países totalmente diferentes.

O primeiro Brasil é um país feliz: está repleto de empresas que querem contratar e de trabalhadores criativos, empreendedores , donos de seu próprio nariz. É a parte de um país moderno - “o país que dá certo” (sic) - que só quer produzir. Que recusa as amarras da “legislação trabalhista” e crê que o acordo entre as partes deva prevalecer sobre a lei.

Só uma coisa perturba essa alegria: os fiscais do trabalho que estão sempre a lembrar que a CLT ainda não foi revogada. Por esse motivo, eles insistem em punir as empresas que não registram os seus funcionários . Ops! A palavra da moda agora é “colaboradores”.

O outro Brasil é triste: dispõe de uma fantástica reserva de mão-de-obra gerada por um modelo econômico excludente e recessivo. Na falta de emprego, os trabalhadores se submetem a qualquer coisa.

Nos últimos anos, a mera falta de registro deu lugar a formas mais sofisticadas de exploração. E é aí que entra o “ato ou negócio jurídico (...) sem vínculo empregatício“ a que se refere a “Emenda nº 3”.

Esses “atos jurídicos” são apenas formas marotas de driblar a legislação trabalhista. Para não serem obrigados a registrar, empresários exigem que os trabalhadores se filiem a cooperativas fraudulentas de mão-de-obra ou criem a sua própria empresa, passando da condição de assalariados para a de prestadores de serviços.

Aqui, não estamos falando de profissionais liberais altamente qualificados ou que gozam de influência (inclusive política) para serem contratados a peso de ouro. Esse grupo, muitíssimo reduzido, pode se dar ao luxo de escolher livremente para quem trabalhar e como quer ser contratado. Essa situação particular certamente não é o alvo principal da fiscalização do trabalho.

Nesse último Brasil, estamos falando de milhares de trabalhadores, qualificados ou não, que são diariamente chantageados pela ameaça do desemprego e, por isso mesmo, compelidos a aceitar o que lhes é possível.

Isso para falar do Brasil urbano, pois existem rincões onde a situação é ainda mais trágica. Basta lembrar das denúncias de trabalho escravo e do assassinato dos auditores fiscais em Unaí.

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